A direção espiritual
No início da sua procura de Deus, Charles de Foucauld
aspirava à fé como se fosse uma certeza racional: «Esta religião poderia não
ser uma loucura…talvez seja a verdade…Lancemo-nos para o estudo desta religião:
arranjemos um professor de religião, um padre instruído e vejamos que virá cá
para fora, e se há razão para acreditar no que ele diz». Logo foi procurar um
“mestre”, encontrando-o na pessoa do Padre Henri Huvelin. Não tinha vontade de
se confessar; apenas queria ter informação sobre a religião católica. Mais
tarde, num dos seus retiros espirituais viria a escrever, ao falar a Deus do
seu mestre de espírito: «Puseste-me sob as asas deste santo e aí fiquei: com as
suas mãos tu me levaste desde então e não tem havido senão uma graça atrás da
outra: eu pedia lições de religião mas ele fez-me pôr de joelhos e
confessar-me; e enviou-me logo a fazer a comunhão. […] Desde então que só tem
havido uma graça após outra». Aquele venerando ancião dirigiu-o sempre com mão
firme. Era um homem de Deus, um homem que «se tornara oração», como o próprio
Foucauld veio a dizer mais tarde.
A santidade é sempre a força que maior poder de atração
exerce sobre as pessoas. O Charles considera a submissão ao diretor espiritual
uma garantia de segurança na difícil procura da vontade divina. Expõe os seus
sentimentos em cada carta que lhe escreve, abre a sua alma o mais possível,
tenta colocar-se num estado de indiferença e promete renunciar a tudo se o seu diretor
espiritual lho pedir, terminando sempre com uma confissão de obediência e com atos
de abandono ao juízo do seu diretor.
Disponibilidade para a conversão contínua
É impressionante a radicalidade da conversão de Charles de
Foucauld. Quebra com o seu passado, decidido a colocar-se radicalmente ao
serviço de Deus. Nunca foi um homem de meias medidas. Sempre quis ir até ao
fundo das coisas em tudo. Até na sua conversão: «Não procuremos corrigir-nos a
meias, ou converter-nos a meias: isso será impossível. É preciso chegar a
converter-nos completamente, se não nunca nos converteremos». Afinal trata-se
de passar dum querer individualista à adesão total e livre ao projeto de Deus:
«Tudo me diz para me converter; tudo me canta a necessidade de me santificar;
tudo me repete e grita para que, se um bem que eu quero não aparecer, será
apenas por minha culpa; e então eu tenho que me despachar na conversão».
No seu itinerário de conversão, o Charles só tem um modelo:
Jesus. «Segue-me, apenas a mim…Não venhas a Betânia para me ver a mim e também
a Lázaro; vem para me ver, só a mim… Pergunta-me o que eu fazia; ‘Examina as
Escrituras’ (Atos, 11); observa os santos, não para os seguires, mas para veres
como me seguiram e pega, de cada um, aquilo que achares que vem de mim, ou é
imitação de mim…e segue-me, só a mim».
Desde este momento, O Charles apenas toleraria um desejo: o
de responder a este amor de Deus, impelido por uma necessidade desmedida de o
imitar: «Eu amo Nosso Senhor Jesus Cristo; amo-o e não poderei levar uma vida
diferente da dele».
Espiritualidade radical e profética
O núcleo central da espiritualidade de Charles de Foucauld é
a “espiritualidade de Nazaré”. Nazaré é um lugar, uma experiência, um símbolo
na sua espiritualidade. A investigação, por vezes bastante fiel, de muitos
exploradores do seu itinerário espiritual, parece ser unânime em afirmar que
viver “como pequeno irmão de Jesus em Nazaré” é certamente a constante que
alumia a sua aventurosa vocação religiosa e unifica o itinerário da sua
maturação eclesial. Ser um pequeno irmão de Jesus equivale a dar vida a uma
relação teologal que se exprime numa coabitação fraterna com o Senhor em prol
dos outros.
Os elementos componentes da espiritualidade de Nazaré podem
sintetizar-se da seguinte forma:
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